quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

O que você mandaria para um buraco negro?

Vou começar pedindo desculpas pelo tamanho deste post. Tentei resumir, mas a esculhambação é muita, não cabe em pouco espaço.


Quando escrevi no último post que “certas ausências preencheriam grandes lacunas”, estava pensando em política. Mais concretamente, na política brasiliense, na contribuição do DF ao nosso grande e fedorento mar de lama nacional.

Brasília vai fazer 50 anos em abril. Foi fundada em 1960, cresceu e consolidou-se durante a ditadura militar. Não tínhamos representação política, voto só para síndico de bloco e para Comodoro do Iate Clube. Os cidadãos brasilienses eram cidadãos de segunda classe.

Em 1986 a Assembléia Constituinte da “Nova República” conferiu aos habitantes do DF o direito de representação no Congresso Nacional. Elegemos pela primeira vez oito deputados federais e três senadores.

Em 1990 elegemos um governador e os primeiros deputados distritais. Tínhamos chegado à tão almejada “autonomia política”.

Foi bom?

Vamos examinar a questão mais de perto:

No plano nacional tivemos três senadores que perderam o mandato:

- pela primeira vez na história do Brasil, um senador foi cassado por falta de decoro parlamentar, envolvido com um juiz lalau em um esquema de desvio de verbas de obras públicas. Esse senador esteve também envolvido com o primeiro presidente impichado, na mal explicada operação-Uruguai.

- outro senador renunciou ao mandato para fugir à cassação, depois de ter violado o sigilo do painel eletrônico do senado, com objetivos inconfessáveis. O senador não se afastou da vida publica, logo voltou à cena como deputado federal e como governador. Transformou-se no primeiro governador a ir em cana no exercício do cargo, acusado de corrupção.

- o terceiro senador, depois de 13 anos como governador do DF, teve também que renunciar ao seu primeiro mandato legislativo para fugir à cassação. Caiu nas malhas da polícia numa operação que investigava desvio de dinheiro público no Banco de Brasília. Na época, o ex-governador e então senador alegou que o dinheiro em seu poder seria fruto de um empréstimo contraído com um poderoso empresário do ramo de transportes, para comprar uma bezerra.

- o primeiro suplente do senador da bezerra teve muita dificuldade para assumir o mandato, em vista do currículo criminal acumulado ao longo de sua trajetória política. Mas conseguiu, contornou os obstáculos e está lá até hoje, auto-proclamado bilionário.

No âmbito regional, a situação é a seguinte:

- O Governador eleito do Distrito Federal está sendo acusado de comandar um milionário esquema de tunga ao dinheiro público, do qual participariam deputados, secretários de governo, assessores de todos os calibres, altos, médios e baixos funcionários do GDF, empresários e concessionários de serviços públicos, com as respectivas mães, esposas, amantes, filhos, filhas, genros, cunhados e motoristas. Filmado com a mão na bufunfa, alegou que o dinheiro destinava-se à compra de panetones para os pobres. Está preso, enquanto aguarda o julgamento definitivo do habeas corpus negado em caráter liminar. Responde a quatro processos de impeachment.

- O Vice-Governador, que assumiu interinamente, também foi apontado como partícipe na tunga. Estava prestes a ser expulso do seu partido mas desfiliou-se a tempo. Em prol da “governabilidade”, anunciou diversas vezes a sua renúncia e voltou atrás. No último sábado, para angariar apoios, convidou os 24 deputados da câmara legislativa para uma reunião de trabalho em sua residência oficial, com direito a churrasco e cerveja. Apesar da boca-livre, apenas cinco deputados toparam aparecer ao seu lado. Ontem capitulou frente ao óbvio e renunciou. Também respondia a vários processos de impeachment.

- O Presidente da Câmara Legislativa, o segundo na linha de sucessão, foi filmado escondendo maços de dinheiro nos bolsos e nas meias. Com apoio de seus pares, fez o possível para melar as investigações e o andamento dos processos de impeachment. Depois de muita relutância teve de afastar-se do cargo por determinação do Tribunal de Justiça, mas ainda preserva o mandato.

- Foi substituído por um amigo de fé e irmão camarada do Governador afastado, eleito pela maioria absolutíssima de 15 votos a favor e sete contra. Em contraste com a sua reputada fidelidade, o novo presidente da CL ostenta um currículo bastante diversificado. Já vendeu picolés, foi frentista, lanterneiro, pintor, balconista e cobrador de ônibus. Hoje é empresário do ramo de supermercados e está filiado ao PR, depois de ter pertencido aos quadros do PSD, PTB, PMDB e PRONA. Ontem, com a renúncia do Vice, virou governador.

- Oito deputados distritais foram acusados de envolvimento nos esquemas da propina e estão impedidos pela justiça de participar das atividades relativas à análise e tramitação dos processos de impeachment contra o governador e o vice. Trata-se de restrição pontual, com mandatos e salários preservados. Dada a possibilidade de falta de quórum para tratar do único assunto que interessa, cogitou-se inaugurar a figura do “suplente de deputado ad-hoc”, com jus a salário integral, gabinete, telefone, verbas de representação e todo o resto. Ao cidadão brasiliense caberia custear oito deputados extra-cota.

- Dos oito deputados envolvidos no esquema, espera-se para breve a renúncia dos três que foram filmados recebendo dinheiro (o da meia, o da oração e a musa do carnaval). A saída clássica para evitar a perda de mandato por falta de decoro parlamentar. Caso as renúncias venham a se concretizar, assumiriam os respectivos suplentes. Encabeçando a lista dos suplentes encontra-se o irmão de um dos empresários acusados de envolvimento no caso, e uma pessoa que está presa por tentativa de suborno de testemunhas.

Dadas essas constatações, tenho que simpatizar com o pedido de intervenção federal no executivo e no legislativo encaminhado pelo Procurador-Geral da República, com a tese de que a linha sucessória do GDF está contaminada. Ele está sendo modesto. A contaminação estende-se para muito além da linha sucessória. A meu ver, inclui também o futuro vislumbrado para depois das próximas eleições.

O jornal de hoje noticia que “distritais se unem para resistir à ameaça de intervenção federal”. Isso quer dizer que situação e oposição vão formar uma coalizão de resistência. Dá medo. Em Brasília, hoje, quando alguém fala em oposição, está se referindo ao senador da bezerra, a seus correligionários e à turma do segundo mensalão. Que tal? Outro dia ouvi o Alexandre Garcia dizer [referindo-se aos políticos] que “se eles  estão contra a intervenção, deve ser bom”. Concordo com o Alexandre.

Finalizando essa loooonga chorumela, só me resta botar fé no efeito borboleta descrito pela teoria do caos. Espero sinceramente que o acelerador de partículas crie um buraco negro suficientemente grande para varrer toda essa corja para fora do universo conhecido. Por mim, pode levar o governador e a assembléia legislativa inteira, com porteira fechada. Essas ausências preencherão lacunas.

3 comentários:

  1. É até difícil entender o conceito de "Distrito Federal". Isto não é um distrito federal, está mais para... deixa pra lá.

    "eles", a que se referia Alexandre Garcia, sãos os distritais, em referência à intervenção, certo? Não ficou muito claro.

    Pelo mesmo buraco negro deve descer o TCDF, totalmente contaminado por membros do governo anterior. Vc viu ontem na TV as propagandas do Roriz?Céus!!!

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  2. pelo mesmo buraco pode ir muito mais gente, não nos esquecendo do governo federal! a dúvida vai ficar na intervenção em grande escala. quem se habilita? Chavez? Os Castros? Sarkozy? Obama? Cristina?

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  3. Meu caro Anônimo
    Esses buracos negros têm duas coisas de bom. A primeira é que eles podem engolir qualquer coisa, de qualquer tamanho ou coloracão. A segunda é que, uma vez transposta a fronteira de entrada, não se pode mais escapar dele. Não tem retorno.
    Portanto, não se acanhe. Pode mandar quem você quiser, sem medo de retaliação e sem perigo de lotação esgotada.
    Um abraço e volte sempre

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